quinta-feira, 11 de agosto de 2011

TRABALHAR OS PAPÉIS DA MEMÓRIA: REEDITAR O FILME DO INCONSCIENTE

Nossos erros históricos relativos à memória parecem coisa de ficção. Há milênios atribuímos à memória funções que ela não tem. Há graves erros no entendimento da memória tanto na psicologia como na educação. A ciência desvendou pouco os principais papéis da memória.
         Milhões de professores no mundo estão usando a memória inadequadamente. O registro da memória depende da vontade humana? Muitos pensam que sim. O registro é automático e involuntário. A memória humana pode ser deletada como a dos computadores? É impossível deletá-la.
         Precisamos compreender os papéis básicos da memória para encontrar ferramentas para poder expandir nossa inteligência, enriquecer nossas relações e reconstruir a educação.
1- O REGISTRO NA MEMÓRIA É INVOLUNTÁRIO



       









Certa vez um professor foi ofendido por um aluno. Sentiu que fora tratado desumana e injustamente. Queria excluir o aluno da sua vida. Fez um esforça enorme. Mas, quanto mais tentava esquecê-lo, mais pensava nele. Ao vê-lo, sentia raiva. Por que não conseguia esquecê-lo? Porque o registro é automático, não depende da Vontade humana.
         Nos computadores o registro depende de um comando do usuário. No ser humano, o registro é involuntário, realizado pelo fenômeno RAM (registro automático da memória).
         Cada ideia, pensamento, reação ansiosa, momento de solidão, período de insegurança é registrado em sua memória e fará parte da colcha de retalhos da sua história existencial, do filme da sua vida. Diariamente, você planta flores ou acumula lixo nos solos da sua memória.
         Infelizmente, por desconhecermos os papéis da memória, não sabemos trabalhar o mais complexo solo da nossa personalidade. Tornamo-nos péssimos agricultores da nossa mente.
         Quanto mais tentarmos rejeitar uma pessoa que nos perturbou, uma perda, uma rejeição social, mais ela será registrada, será lida e construirá milhares de pensamentos.
         A melhor maneira de filtrar os estímulos estressantes não é tendo raiva, ódio, rejeitando-os ou reclamando deles, mas:   
         1- Entendendo-os.
       2- Criticando-os.
    3- Enxergando-os multifocalmente, ou seja, por outros ângulos.
         4- Usando-os como oportunidade para crescer.
         5- Determinando não ser escravo deles.

2- A EMOÇÃO DETERMINA A QUALIDADE DO REGISTRO

         Quanto maior o volume emocional envolvido em uma experiência, mais o registro será privilegiado e mais chance terá de ser lido. Você registra milhões de experiências por ano, mas resgata freqüentemente as experiências com maior conteúdo emocional, como as que envolveram perdas, alegrias, elogios, medos, frustrações.


         Onde as experiências são registradas? Primeiramente na MUC (Memória de Uso Contínuo), que é a memória utilizada nas atividades diárias, a memória consciente. As experiências tensas são registradas no centro consciente e, a partir daí, 
serão lidas continuamente. Com o passar do tempo, à medida que não são utilizadas com freqüência, vão sendo deslocadas para a parte periférica da memória, chamada de ME (Memória Existencial). Veja dois exemplos:


         Alguém acabou de elogiá-lo. Você registra na MUC. Leu diversas vezes esse elogio. No dia seguinte, você não o lerá tanto. Na semana seguinte, é provável que já não o leia mais. Entretanto, esse elogio não foi apagado, foi para o território inconsciente, para a ME. Continuará influenciando a sua personalidade, porém com menor intensidade.
         Você acabou de dar uma conferência e perdeu o raciocínio no meio da preleção. Não conseguiu falar o que queria, estava nervoso. As pessoas perceberam sua insegurança. Você registrou essa experiência na MUC. Se você conseguiu filtrá-la, através da crítica e da compreensão, ela foi registrada sem grande intensidade. Se não conseguiu proteger sua memória, ela foi registrada intensamente. Nesse caso, será lida com freqüência, produzirá milhares de pensamentos angustiantes, que serão registrados, gerando uma zona de conflito, um trauma. Assim, ela não irá para a ME, ficará plantada na MUC como janela doentia. Trabalhe os papéis da memória para não formar zonas de conflito!

A emoção não apenas determina a qualidade do registro das experiências, mas também o grau de abertura da memória. Emoções tensas podem fechar a área da leitura da memória (janela), fazendo-nos reagir sem inteligência, por instinto.

         Em alguns momentos, entramos em janelas belíssimas e produzimos pensamentos que cultivam belas emoções; em outros, entramos em janelas doentias que promovem tormentos, angústias e desolações.
         Você já notou que às vezes somos incoerentes diante de pequenos problemas e lúcidos diante de grandes? Nossas mudanças intelectuais não são promovidas pelo tamanho dos problemas externos, mas pela abertura ou fechamento das áreas da leitura da memória.
         Pequenos problemas como um olhar de desprezo ou a imagem de uma barata, podem gerar uma crise de ansiedade, a qual fecha áreas nobres da memória e impede, obstrui a inteligência.
         Em alguns casos, o volume de ansiedade ou sofrimento pode ser tão grande que você reage sem nenhuma lucidez. Toda vez que tiver uma experiência que gera alta carga emocional ansiosa você tem de atuar.
         Certa vez presenciei um pai e um filho adolescente brigarem fisicamente na minha frente por um problema tolo. O motivo externo era pequeno, mas ele acionava as imagens monstruosas que um tinha do outro e que geravam grave intolerância e crise de ansiedade.
         Nunca se esqueça de que você deve ser o autor da sua história. Gerencie seus pensamentos, administre sua emoção, duvide da sua incapacidade, questione sua fragilidade, veja as coisas por múltiplos ângulos. Se não proteger a memória, não há como ter qualidade de vida.
         Uma crítica mal trabalhada pode romper uma amizade. Uma discriminação sofrida pode encarcerar uma vida. Uma decepção afetiva pode gerar intensa insegurança. Uma falha pública pode gerar bloqueio intelectual. As brincadeiras em que certos alunos são chamados por apelidos pejorativos podem gerar graves conflitos. 

Augusto Cury - "12 semanas para mudar uma vida".

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